12/11/13

burocracia da dor

tanta burocracia na dor.
para sofrer é fácil, rápido, imediato até.
para sair da depressão, para se afastar do que magoa, para se libertar do que dói já é diferente.
já tem que se ligar a um para pedir a outro aquilo que a outro compete ver se questiona o primeiro.
tem que se pedir por favor, com gentileza, mesmo com a ferida aberta. tem que se ser simpático até na procura da cura. tem que se ser suave a pedir uma forma simples de nos libertarmos das coisas duras e fodidas do corpo, da alma e da vida.
já não chega doer. é preciso doer mais. é preciso que a dor seja assistida, gerida por outra pessoa que não faz a mínima ideia do que se fala.
a burocracia da dor só nos deixa ver-nos livre dela quando desistimos ou quando se está disposto a pagar um preço tão alto quanto a própria dor. quando a humilhação compensa, quando abrir o coração e as feridas em praça pública seja a única forma. quando ninguém sabe ajudar, quando se passa de novo mais algum tempo à espera que, miraculosamente, as feridas fechem e as portas se abram. que a burocracia acabe e tudo volte ao normal.
a burocracia na dor é a forma mais cruel de a superarmos. é a forma mais longa de a mantermos. e não porque queremos e somos casmurros ou masoquistas, mas porque alguém a comanda. quando alguém sentado no gabinete do sofrimento diz Não. quando a nossa força, por maior que seja, é constantemente posta à prova por um bando de polícias da dor a nos intimidar - Daqui não passas, tens que sofrer.
tanta burocracia na dor.
tanta confusão para se deixar de sofrer.
tanta merda para se começar a viver.

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